A promessa de um menino no livro de Isaías se refere ao Rei Messias?

Por: Cleiton Gomes 



Existem pseudo-judeus (ex-cristãos/ falsos judeus) afirmando que os textos apresentados pelo discípulo Mateus (1:18-25) foram frutos de manipulação da igreja católica apostólica romana, sendo resultado do sincretismo religioso. Afirmam que os textos de Isaías não são profecias messiânicas, que o Messias não nasceria de uma donzela virgem, mas que nasceria da relação conjugal comum. 


Em que pese nutrir respeito aos que pensam dessa maneira, sentimos em dizer que os textos de Isaías merecem mais aprofundamento exegético do que parece ser. Primeiro, importa registrar que o texto de Isaías 9:7[5] apresenta uma palavra hebraica colocada em um lugar incomum no texto. Estamos falando do "mem fechado" (ם), que deveria aparecer apenas no final das palavras conforme a regra gramatical, todavia, apareceu no meio da palavra "aumente" (da frase: para que se aumente o seu governo), que em hebraico se escreve: לםרבה = Lemarbê. 


Conforme eruditos, o "mem fechado" está relacionado a um conhecimento ainda não revelado, um "segredo". Confira a seguinte assertiva:


"O mem aberto e o mem fechado indicam que a Torá contém uma declaração aberta, compreendida por todos, e uma declaração esotérica". (Shabat 104a,  veja também: Sanhedrin 94a). 


Conforme os antigos sábios, o "mem fechado" faz alusão ao Messias, veja:


Nossos Sábios ensinaram que a letra fechada mem que normalmente aparece apenas no final de uma palavra, mas aqui aparece no meio da palavra l'marbeh, é uma alusão a Mashiach…” (Shmais.com, Living with Mashiach #1131).


Qual a necessidade de existir um segredo em um texto totalmente literal? Se tudo já tivesse sido evidenciado como afirmam os críticos, não existiria mais nada a ser declarado. Em razão disso, rabinos concluíram que os textos em hebraico de Isaías, apresentam uma linguagem em "tempo profético imperfeito", nos quais o profeta apresenta conceitos de algo que ainda vai acontecer no futuro como se já estivesse acontecendo; era algo bastante comum no texto em hebraico, confira: “Na maior parte da profecia é encontrado que o falante usa um tempo passado no lugar de um futuro; pois é como se a coisa já tivesse acontecido quando foi dita no Espírito Santo.”.  (R. David Kimchi no Salmo 3:5). Tratar algo como estritamente passado, presente ou futuro em hebraico não é totalmente correto. O hebraico é composto de tempos perfeitos (completos) e imperfeitos (incompletos). 


É por isso que existem comentários judaicos dizendo que o texto de Isaías se aplica também ao Rei Messias:


Agora eu tenho que estabelecer a realeza do Messias, de quem está escrito: 'Porque um menino nos nasceu' (Isaías 9:5)”. (Devarim Rabbah 1:20). 


Este é um texto estranho. No entanto, à medida que me aprofundei nele, vi que ele confirma muitas coisas. Assim, você descobrirá que os Sábios de memória abençoada sempre explicam que os textos bíblicos que são ditos com referência a Chizkiyah (Ezequias) se aplicam ao futuro". (R' Moshe ben Nachman (Ramban), The Book of Redemption, the Second Gate, Writings of the Ramban, Shilo Publishing House, página 660). 


O profeta disse à casa de Davi: Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e ele tomou sobre si a lei para guardá-la. Seu nome é chamado diante daquele que é maravilhoso em conselho, o Deus poderoso que vive para a eternidade - o Messias cuja paz será grande sobre nós em seus dias". (Targum Yonatan sobre Isaías 9:6). 


Ben Burton (Benjamin Burton), ao falar sobre o assunto do nascimento virginal, explica:


Mateus… aprendeu sobre a concepção virginal e pesquisou nas Escrituras a fonte dessa ideia. Ele olhou para a profecia do nascimento do Messias em Isaías 9 e procurou conexões adjacentes à passagem, levando-o ao misterioso nascimento de Emanuel. Não é nenhum salto considerar o nascimento profetizado no capítulo 7 como tendo alcançado seu cumprimento no capítulo 9. Ele é o Emanuel do Capítulo 7, a pedra de tropeços do capítulo 8, o Príncipe da Paz do Capítulo 9, aquele em quem o Espírito repousa no capítulo 11, e aquele que destruirá o mal na guerra final de Gog e Magog como Isaías diz "Ele golpeará a terra com a vara de sua boca e com o sopro de seus lábios matará o ímpio" (Isaías 11: 4). O Targum interpreta esta passagem da seguinte forma "... com a palavra de seus lábios ele matará Armilus, o ímpio". (Targum Yonatan em Isaías 11, Sefaria.org cf. Apocalipse 19: 15)"... Armilus é o nome do que os cristãos chamam de "Anticristo". (Fonte: The Mystery of the Mem, An explanation of the virgin birth, 2ª edição: 2021, páginas 66 e 67).


Vale registrar que o valor numérico da letra hebraica "mem" é 40; e, alguns sábios afirmaram que a era messiânica duraria 40 anos (Sanhedrin 99a), isso culmina no pensamento de que "todos os profetas profetizaram apenas sobre a era messiânica" (Sanhedrin 99a). Além disso, o Sêfer Bahir (84 e 85) e o Sêfer Ietsirá 3:6, afirmam que o  "mem fechado" está associado ao ventre materno, mas precisamente a um ventre que não pode dar a luz, podendo se referir a uma mulher estéril e/ou a uma virgem. 


O professor nazareno, Tsadok Ben Derech, registra algo importante sobre um detalhe deixado no texto hebraico de Isaías, confira:


Yeshayahu (Isaías) profetizou que YHWH daria um sinal e uma donzela daria à luz um filho. Ora, uma mulher dar à luz é fato natural, e não um sinal! Somente faz sentido o texto se o “sinal” se referir a algum tipo de milagre. Com efeito, a palavra hebraica “ôt” (אות) significa “marca”, “sinal”, e é também usada pela Torá com o sentido de “milagre” (Exemplos: Ex 4:8, 9, 17, 28, 30; 7:3; Nm 14:11, 22; Dt 4:34). Aplicando este sentido à profecia de Is 7:14, a donzela teria um filho e isto seria um milagre, razão pela qual o nascimento virginal do Mashiach enquadra-se perfeitamente neste quadro profético". (Fonte: Congregação Messiânica B'nei Or; artigo: Nasceu Yeshua de uma virgem? ). 


O professor messiânico, Rav. Maorel Melo, declara que a ideia de nascimentos milagrosos são compatíveis ao antigo pensamento judaico, confira:


Não é a primeira vez nas Escrituras que uma mãe tem um filho por obra da Ruach HaKodesh, os exemplos de nascimentos de natureza milagrosa são tantos e tão popularmente conhecidos de todos, que acredito não ser necessário numerá-los aqui [...] O Rabino Aryeh Kaplan, no prefácio do livro Sefer Yetzirá, comentado por ele, ele nos informa que Ben Sira, o filho do Profeta Jeremias, nasceu de sua mãe e seu pai, sem contudo o Profeta ter sequer estado perto da futura mãe do menino quando ela engravidou, e seu vínculo com a moça em questão só forçosamente se estabeleceu apenas depois deste constatado fato. O mesmo Rabino nos transporta para o talmud ... e nos informa que o Rav Zeira e o Rav Papa nasceram da mesma forma que o Ben Sira... ou seja; suas mães engravidaram de seus pais sem contudo terem sido tocadas por eles. Assim, Maria não teria sido a primeira passar por esse fenômeno, agora ela se encontra entre quatro virgens judias que sofreram o mesmo fenômeno, o status espiritual de seus filhos é que diferem, mas a forma como foram concebidos pela Ruach HaKodesh através da semente dos pais milagrosamente transportadas para as mães foi a mesma.


Evoco agora o Talmud, Tratado Sotá 12a, na passagem em que ele informa que Yocheved [Joquebede], já mãe de duas crianças, Miriam e Arão, teve a sua virgindade milagrosamente restaurada e só depois foi que engravidou de Amram, futuro pai de seu caçula Moshé. Isso me parece uma obra muito mais fantástica do que o ocorrido com Miriam HaNotzerit [Maria de Nazaré]! Pois, se para alguns é impossível que tal nascimento tenha ocorrido, o que se dirá de uma senhora [de 130 anos], mãe de dois filhos, voltar a ter sinal de virgindade, engravidar sem ser tocada pelo seu marido, e dar à luz virgem?!”. (Judaísmo e Messianismo, Ed. Fonte Editorial, 2020, páginas 446-7). 


No mesmo sentido, o judeu cabalista, Moshe Idel, ao analisar os nascimentos milagrosos descritos pela literatura judaica, conclui que essas ideias podem, naturalmente, refletir o nascimento milagroso de Yeshua, o qual ele chama “imaculada conceição”. Confira suas palavras:


"R. Nathan segue uma discussão encontrada em Abulafia, onde o processo de inseminação é descrito no contexto de Adão e Eva [...] ela [Eva] é inseminada pelo que ele [R. Nathan] chama de 'Espírito Santoʼ, Ruah ha-Qodesh, e dá à luz um 'filho duradouro' – Ben shel qayyima. O recurso a este termo em um contexto tão específico, em um livro provavelmente escrito em Messina, pode muito bem refletir o impacto de uma visão cristã da Imaculada Conceição por meio do Espírito Santo". (Filho: Filiação e Misticismo Judaico, Editora Continuum, capítulo 3, página 337/ título original: Ben: Sonship and Jewish Mysticism).


O judeu ortodoxo, David Flusser (1917-2000), foi um historiador da Universidade Hebraica de Jerusalém. Em seu livro falando sobre "Jesus", escreveu as seguintes palavras:


"O relato milagroso do nascimento de Jesus pode ser encontrado em duas versões literárias independentes, a de Mateus e a de Lucas [...] que contam a história do nascimento virginal. Parece que os dois evangelistas não viam nenhum conflito entre Jesus descender de Davi através de José e sua concepção sem a intervenção de um pai humano". ("Jesus". Editora Perspectiva, 1ª edição, 2019, página 8).


O discípulo Mateus estava convencido de que os textos do profeta Isaías continham segredos sobre a vinda do Messias, tanto que citou textos do capítulo 9 de Isaías, aplicando a Yeshua (cf. Isaías 9:1 combinado com Mateus 4:12-16). Entretanto, mesmo com essa quantidade de informações, os críticos continuarão a dizer que o nascimento virginal de Yeshua é plágio do paganismo; e os adeptos dessa teoria que ainda dizem ser crentes em Yeshua, dizem que o Messias jamais poderia ter nascido de uma virgem. Mas, que tal colocar dois pesos e duas medidas para por equilíbrio nessas ideias? 


Os críticos costumam citar paralelos pagãos para dizer que os discípulos de Yeshua plagiaram tais ideias, daí, o "Novo Testamento" seria um documento pagão. Contudo, também sabemos terem existido paralelos entre o nascimento do monarca Sargão e o profeta Moisés, onde ambos foram abandonados ainda bebês à beira do rei dentro de uma cesta de juncos, fechadas com betume, depois criados por pessoas que nem eram da sua família biológica. Porém, qualquer antimissionário jamais ousaria dizer que Moisés nunca existiu ou que nunca aconteceu aquela dramática história durante o seu nascimento. 


Além disso, também sabemos terem existido vários relatos de dilúvios em outras regiões pagãs, será que isso significa que o dilúvio pregado no Tanach também é plágio do paganismo? Absolutamente não! Assim sendo, não é porque existem possíveis relatos de nascimentos incomuns na mitologia grega, que os discípulos de Yeshua tenham emprestado tais conceitos deles. Ora bolas! Segundo a mitologia grega, os deuses se manifestavam em forma humana e tinham relações sexuais com mulheres humanas e desse relacionamento nasciam semideuses, porém, sabemos que YHWH não se manifestou em carne e transou com Maria (esses detalhes não estão escritos no "Novo Testamento" porque não fazem parte da redação dos discípulos de Yeshua), de modo a afirmar que Yeshua não era um semideus. Por isso Raymond E. Brown declarou: 


Não há nenhum exemplo claro de concepção virginal no mundo ou nas religiões pagãs que plausivelmente poderia ter dado aos cristãos judeus do primeiro século a ideia da concepção virginal de Jesus". (Raymond E. Brown, O Nascimento do Messias - Um comentário sobre as narrativas da infância em Mateus e Lucas, Ed. Doubleday, página 523/ título original: The Birth of the Messiah: A Commentary on the Infancy Narratives in Matthew and Luke). 

 

E ainda: costumam dizer que a palavra "almah" significa apenas "jovem" e "donzela" e não virgem. Nesse sentido estão corretos, porém, era natural que uma jovem donzela fosse virgem, tal como Rebeca (Gênesis 24:16, 42). Além disso, na época de Yeshua, uma donzela era considerada adulta aos 12 ou 13 anos de idade, de modo a seus pais poderem dá-la em desposamento por meio de um dote (um acordo financeiro). Sabemos que os casamentos eram arranjados e não existia "namoro as escondidas", de modo que Maria era uma donzela virgem quando foi prometida para José". A própria Maria afirmou não ter relação sexual com homem algum (Lucas 1:34).


Naquela sociedade judaica do tempo de Yeshua, era comum o casamento de uma jovem ser totalmente arranjado pelo seu pai. Se o pai da jovem já tivesse morrido antes de ela atingir a idade para se casar, o irmão da moça ou outro parente próximo do sexo masculino, assumiria o papel do pai da moça e arranjaria o casamento para ela. O pretendente deveria entrar num acordo financeiro com o pai da moça ("pagar um dote"). Esse acordo financeiro também era entendido como o “início do noivado”, mas o homem só podia ter a primeira relação sexual com sua amada após 12 meses depois da data do noivado, conforme afirma o historiador Geza Vermes (Fonte: Natividade, Ed. Record, 2007, página 72). O noivo então levava a noiva para a casa dele em meio a solenes festividades das quais participavam a família, os amigos e os vizinhos. 


Em suma, conforme registros históricos da patrística, os netsarim (nazarenos) foram taxados hereges por continuar praticando os mandamentos prescritos na Torá. Mais uma coisa sobre eles foi dito, que acreditavam no nascimento virginal: "Eles [os nazarenos] acreditam que o Messias, o filho de Deus, nasceu da virgem Maria". (Jerônimo, Letter 75, Jerome to Augustine).  


Assim sendo, ainda que os textos de Isaías sobre o nascimento de um menino tenham acontecido naquela época (cf. Isaías 8:3-4), o segredo do "mem fechado" deixado no capítulo 9, deixa claro que as palavras se estendem ao futuro, se tratando de uma profecia messiânica! Após este extenso exame, desmoronam as teorias nefastas sobre o nascimento de Yeshua!



Seja iluminado!!! 






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