Por: Cleiton Gomes e Rodrigo Sêmani.
Muitas pessoas costumam dizer que todos nós já nascemos com um pecado que não cometemos, que é um pecado herdado desde o tempo de Adão. E que esse pecado só é anulado pelo batismo nas águas. É por pensar assim que algumas igrejas cristãs realizam o batismo em criancinhas, ou melhor dizendo, em bebês. Alguns evangélicos, por pensar assim, consomem 80% do tempo em suas pregações para falar somente sobre o batismo nas águas.
No entanto, ao analisar as sagradas escrituras, nada encontramos sobre a ideia de que herdamos, de forma genética, os pecados cometidos pelo primeiro Adão. Somos cientes de que nascemos em um mundo onde a consequência do pecado de Adão está presente, pois o mundo está um verdadeiro caos; porém, não herdamos o pecado de ninguém. O pecado é a consequência de uma ação voluntária e individual de cada ser humano, isto é, daqueles que já têm a capacidade de decidir entre o bem e o mal. Quer dizer que não existem bases bíblicas para sustentar a ideia de que os bebês devem ser obrigatoriamente batizados.
De forma muito "forçada" muitos têm feito parecer que O Tehilim/Salmos 51 mostra que David foi uma pessoa que herdou o pecado de Adão, pois está escrito: "Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe." (Salmos 51:5). Entretanto, dizer que esse texto mostra que ele nasceu literalmente com o pecado de Adão, é desconhecer todo o pano de fundo por trás dessa declaração. Pois as palavras de David foram baseadas no conceito de que sua mãe havia cometido adultério, de modo que David teria sido esse fruto que nasceu por meio deste ato sexual ilícito. É por isso que ele fez essa declaração, e caso você queira saber um pouco mais sobre essa história, clique AQUI.
Todos os acadêmicos sabem ou deveriam saber que a ideia de pecado original é um pensamento criado muitos anos depois da morte de todos os apóstolos. Foi uma doutrina criada por Agostinho de Hipona (354 a 430 d.C) também conhecido pelos católicos como "Santo Agostinho"; sua ideia foi criada numa controvérsia que ele teve com o monge Pelágio da Bretanha (360 a 420 d.C). Sobre o debate deles não iremos falar aqui, permitindo que você possa procurar outras fontes de estudo que falem exclusivamente deste debate entre eles.
Não acreditamos que o ser humano já nasce sendo um pecador (contrariando a ideia de Agostinho), mas pode se tornar pecador mais tarde, ao longo da sua vida (concordando com o pensamento de Pelágio). Mas, ao contrário de Pelágio que acreditava que os seres humanos não precisam da graça para serem salvos, nós acreditamos que o ser humano é totalmente dependente da graça. A salvação é pela graça.
Embora o ser humano não nasça sendo pecador, na sua carne são colocadas duas inclinações. A primeira é a inclinação para o bem (Yetzer HaTov) e a segunda é a inclinação para o mal (Yetzer Hará). Todo ser humano nasce com a inclinação da carne para o mal, e se ele permitir que esse impulso tome conta da sua vida, certamente se tornará um pecador mais tarde. Eis um texto bíblico nesse sentido: “E Adonai aspirou o suave cheiro e disse consigo mesmo: Não tornarei a amaldiçoar a terra por causa do homem, porque é mau o desígnio íntimo do homem desde a sua mocidade; nem tornarei a ferir todo vivente, como fiz.” (Gênesis 8: 21). A palavra em hebraico que foi traduzido como "desígnio" é a palavra Yetzer, que significa "inclinação".
Preste atenção no detalhe que diz que a má inclinação se manifesta no ser humano de forma intensa durante a sua mocidade e não quando ele é recém-nascido. Na sua mocidade aquela pessoa já tem a capacidade de escolher o que bem quiser pois já é responsável pelas suas escolhas, tendo consciência de suas consequências (por isso que os judeus fazem o Bar Mitzva de seus filhos na idade de adolescência, indicando que aquela pessoa já é responsável pelas suas próprias ações). Claro, as primeiras demonstrações de má inclinação são demonstradas em crianças de 4 anos de idade pra frente, porém, essas ações ainda são tidas como involuntárias e não voluntárias, já que a criança em si não sabe exatamente o que está fazendo; ela ainda não tem discernimento (exemplos: Isaías 7:15; Deuteronômio 1: 39). Disto resulta que o ETERNO ainda não imputa a culpa por erros cometidos por aquela criança, já que ele não leva em conta o tempo da ignorância. Mas quando a pessoa é consciente de suas ações, certamente serão imputados sobre si todos os erros que foram cometidos (vide, por exemplo: Números 15: 22-31). Em outras palavras, as consequências virão sobre a vida daquele que agiu de forma errônea.
Antes de Adão e Eva cometerem pecado, o ETERNO já havia falado sobre essas duas inclinações que poderiam ser colocadas neles se caso viessem a comer do fruto proibido (Gênesis 3: 5). Quando eles pecaram, essas inclinações foram colocadas neles completamente, e todos que vieram depois deles também receberam essa inclinação como consequência do pecado cometido por Adão e Eva.
A título de informação, o Yetzer Hará é uma tendência instintiva que foi criada pelo próprio ETERNO, que é capaz de impelir o ser humano a realizar determinados atos que se manifesta no homem em forma de necessidades pessoais inadequadas, sem levar em conta as consequências morais de satisfazer os desejos. Os instintos maus, egoístas e meramente carnais, são todos causados pelo Yetzer Hará. Quem se deixar ser dominado por esse desejo durante a sua adolescência, certamente estará caminhando para a morte, já que estará começando a praticar pecados. E quem pratica pecado, estará em desobediência às instruções do ETERNO, e a consequência da desobediência voluntária é a morte (Romanos 6: 23; 1ª João 3: 4). É por isso que Paulo ensina que a morte passou de Adão a todos os seres humanos (1ª Coríntios 15: 21-22; Romanos 5: 12-14).
Essas duas inclinações existem para garantir a existência da capacidade de escolha do ser humano, o chamado "livre arbítrio". Mas, o que devemos fazer para vencer a má inclinação? O Yetzer Hará poderá ser combatido quando as pessoas se dispõem a aprender para depois botar em prática os mandamentos da Torá, pois a Torá ativa o Yetzer HaTov dentro do ser humano, impelindo-o a praticar o bem. Nesse sentido, citaremos o que diz o Talmud:
“Mesmo assim, o Santo, bendito seja, falou a Israel: ‘Meus filhos, eu criei o impulso mau, mas eu [também] criei a Torá como seu antídoto. Se vocês se ocuparem da Torá, não serão entregues ao domínio do impulso mau. Mas, se não se ocuparem da Torá, então serão entregues ao poder do impulso mau’.” (Talmud Bavli, Kidushim 30b).
O apóstolo Paulo, ao falar sobre esse assunto, usa palavras como "batalha da carne contra o espírito" (Romanos, capítulo 7 e capítulo 8). O assunto é o mesmo, muda apenas os nomes para se referir a essas duas inclinações já citadas. Ele ensina que quando nos rendemos à graça do Messias, somos libertado da má inclinação (Romanos 7: 23; 8: 1-2), e se antes éramos contra os mandamentos do ETERNO por agirmos de forma carnal, após sermos libertos podemos desfrutar de alegria ao praticar os mandamentos do ETERNO adequadamente (Romanos 8: 4-8), sendo inclinados a praticar o bem.
Em suma, conforme demonstrado aqui, não existe nenhuma base no Tanach (vulgo: "Antigo Testamento") que sirva para sustentar a ideia de pecado original. Já que não existem bases no Tanach, então nos escritos dos apóstolos também não existe essa ideia, já que o Tanach era a Bíblia da qual todos os apóstolos extraiam os seus ensinamentos. A ideia de pecado original baseada em textos dos escritores apostólicos, são ideias baseadas em textos fora de contexto, interpretados erradamente por causa da influência do engano que já foi disseminado durante muitos séculos.
Seja iluminado!!!
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