Por: Cleiton Gomes
Façamos a leitura do trecho bíblico:
"Olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, Queimadura por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe." (Êxodo 21:24-25; veja também: Lev.24:20 e Deut. 19:21 ).
Ao contrário do que muitos pensam, esta norma da Torá não está incentivando a violência e retaliação; trata-se de uma regra que ampara os prejuízos causados a alguém, onde o causador do problema seria penalizado pelo juiz e deveria pagar todo o dano cometido na mesma medida do estrago que causou. Compare o que acabou de ser dito com o seguinte texto bíblico:
“Se homens brigarem, e ferirem mulher grávida, e forem causa de que aborte, porém sem maior dano, aquele que feriu será obrigado a indenizar segundo o que lhe exigir o marido da mulher; e pagará como os juízes lhe determinarem.” (Êxodo 21:22).
Para endossar esse conhecimento ainda mais, citamos o argumento do historiador Geza Vermes:
“É quase desnecessário lembrar que no ensinamento pós-bíblico, Êx.21:24 não era interpretado literalmente como exigindo que um dano correspondente fosse infligido à pessoa culpada de causar injúria corporal. Uma vingança sangrenta era substituída por uma compensação monetária judicialmente estabelecida…” (A religião de Jesus, o Judeu, Imago, 1995, páginas 40 e 41).
Trata-se de uma lei natural de causa e efeito, onde a pessoa pagará seus delitos na mesma proporção que o causou. Por exemplo, sabemos que Caim, filho de Adão, matou o seu irmão utilizando uma Pedra; O Livro dos Jubileus registra que Caim morreu quando a sua casa feita de pedra caiu sobre ele:
"Ao final deste jubileu, Caim foi morto após ele [Adão] neste mesmo ano; porque sua casa caiu sobre ele e ele [Caim] morreu no meio de sua casa, e ele foi morto pelas suas pedras; porque com uma pedra ele havia matado Abel, e por uma pedra foi ele morto em justo julgamento. Por essa razão foi ordenado nas tábuas celestes: “Com o instrumento com o qual um homem matou seu vizinho, com o mesmo ele deve ser morto; Do modo como feriu, do mesmo modo deve-se lidar com ele.” (Livro dos Jubileus 4;31-34; tradução de L. F. S. Prado).
Essa lei natural de causa e efeito existe antes de Moisés e do rei babilônico, Hamurabi. Foi dito isso porque alguns chegam a pensar que a lei do "olho por olho" teria sido inventada por Hamurabi e Moisés teria plagiado esta ideia; mas, acabamos de ver que é falsa esta afirmação dos céticos, sendo apenas um conhecimento popular repassado por gerações antes desses personagens. A regra em questão também foi chamada "lei de talião". Aqui também se aplica aquela fala de Yeshua, no sentido de "quem com ferro fere com ferro será ferido" (Mat. 26:52).
O Messias também lecionou sobre a regra sub examine (Mat. 5:38-39), dizendo para seus discípulos não se preocuparem em receber indenização, pois, uma maior recompensa iriam receber no mundo vindouro. Ainda que estivessem em seus direitos legítimos, deveriam aguentar as injúrias sem revidar, demonstrando a bondade predominante em seus corações. Foi por essa razão que lecionou:
"Se te derem um tapa na face direita, dê a outra face para bater" (Mat. 5:39);
"Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus" (Mat. 5:44).
Sobre essa lição, escreveu o Rabino John Fischer:
“O ponto de Yeshua aqui enfatizado é a resposta adequada para o insulto de ‘levar um tapa na cara’. Uma pessoa não deve buscar a reparação ou retaliação, mas suportar o insulto humildemente. Com isso, os rabinos concordaram e aconselham que quem recebeu um golpe na face deve perdoar o ofensor, mesmo que ele não peça perdão (Tosefta Baba Kamma 9:29f). O Talmud elogia a pessoa que aceita ofensa sem retaliação e se submete ao sofrimento e ao insulto alegremente (Yoma 23a)” (Jesus through jewish eyes: a Rabbi examines the life and teachings of Jesus, Rabbi John Fischer).
Adicionando mais detalhes sobre o significado de "dar a outra face", cito agora aquilo que escrevi em meu livro:
“... a frase de Yeshua “quem bater na sua face direita, ofereça-lhe a outra face para bater”, também não deve ser entendida como pensam a maioria das pessoas, como se nós devêssemos apanhar sem ter o direito de nos defender. Na verdade, essa lição ensina que não devemos reagir às provocações da pessoa mal-intencionada. O Mestre estava mostrando que não devemos pagar o mal com o mal, mas pagar o mal com o bem, para que a outra pessoa que estava lhe provocando se sinta envergonhada pelo mal que estava lhe causando. Ele ensinou que devemos suportar humildade às provocações e nunca buscar a vingança contra aquelas pessoas que lhe fizeram mal. Ensinou que devemos demonstrar amor mesmo quando as outras pessoas não merecem.
Essa mesma lição é encontrada no livro de Lamentações, veja só: “Quando alguém lhe bater, ele deve mostrar a outra face; deve aceitar os insultos sem devolver" (Lamentações 3: 30, Bíblia Viva, 2002).
Naquela época, bater na face de alguém não era considerado uma briga violenta, pois, o golpe não era muito forte. Era um pequeno tapinha, uma forma de insulto e provocação. Haviam normas proibindo essa forma de provocação naquela época. Aquele que batesse com a mão na face de alguém estava sujeito a pagar um valor monetário pelo insulto cometido. Uma indenização pelo dano moral cometido. Bater com as costas da mão na face de alguém era duas vezes mais ofensivo do que um tapa normal; e por isso, o valor da indenização pelos danos morais cometidos também aumentaria.
Esta lição é descrita no Mishnah: "Se alguém der um tapa em outra pessoa, ele deve pagar duzentos Zuz. Se for com as costas da mão, ele deve pagar quatrocentos Zuz. Se alguém torcer a orelha de uma pessoa, puxar seu cabelo, cuspir ou gastar-lhe a capa em público, [o autor] deve pagar quatrocentos Zuz." (Tratado de Nezikin – Bava Kamma 8: 6).” (Obra citada: Ainda Há Esperança – O Chamado para Retornar, 2020, páginas 112 a 114).
Consoante os dados analisados, chegamos à conclusão simples de que o mandamento do "olho por olho" não é uma regra existente na Torá que incentiva a violência, como se quisesse demonstrar que o ETERNO criou uma lei cruel para punir os delinquentes. O Santíssimo não é pura crueldade, pelo contrário, a sua essência é amor, misericórdia e justiça. Nunca houve um momento em que o ETERNO tenha deixado de ser bom. Daí, esta regra da Torá ensina que o injusto é penalizado com justiça justa.
Seja iluminado!!!
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