Por: Cleiton Gomes
Acreditamos que o servo sofredor de Isaías 53 é o Messias, que sofre como representante da nação de Israel. Porém, sempre há aqueles que lançam dúvidas sobre o texto, dizendo que ele nem se refere ao Messias e sim somente a Israel.
Podem discordar o tanto que quiserem, mas há fatos que são indiscutíveis. Vamos aos fatos. Assim como "o Messias é chamado de Davi" no livro do profeta Ezequiel, assumindo o papel de restaurador das Duas Casas de Israel (Ezequiel 37: 16-24), da mesma maneira "ele é chamado de Israel" no livro de Isaías, e o livro também mostra que sua missão é restaurar as Duas Casas de Israel:
"... Tu és meu servo; és Israel, aquele por quem hei de ser glorificado."
(...)
"Disse mais: Pouco é que sejas o meu servo, para restaurares as tribos de Jacó, e tornares a trazer os preservados de Israel; também te dei para luz dos gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra." (Isaías 49: 3,6).
Muitos tentam dizer que o Messias não é o Salvador, e isso é um grande equívoco. O aclamado Rabino Louis Ginzberg, ao falar sobre o Messias, conta que ele foi nomeado para trazer a salvação, de modo que não há salvação fora do Messias. (Bibliografia indicada: The Legends of the Jews; Editora: The Jewish Publication Society, 2ª edição - 2003, volume 1; Capítulo 1: A criação do mundo; Tópico: As primeiras coisas criadas).
No mesmo sentido, escreveu o Rabino Menachem M. Brod:
“Alguns judeus consideram o envolvimento intenso com Mashiach e a redenção como excessivo. Afinal, argumentam, por que concentrar-se em assuntos aparentemente irrelevantes para a vida diária? Infelizmente, eles deixam de ver que Mashiach e a Redenção não são assuntos triviais, secundários. São o propósito da nossa vida, de toda ação que fazemos, e de toda a criação. Tudo que acontece no mundo e cada mitsvá que cumprimos está nos levando na direção de Mashiach e da Redenção. Todo judeu que está comprometido com a Torá e mistvot, porém negligente em relação a Mashiach, é como um piloto que está alheio ao seu destino.”
(...)
“Mesmo que alguém acredite em Mashiach mas simplesmente não o espera, essa pessoa é um herege! [...] Um judeu pode acreditar em todos os Treze Princípios da fé e passar a vida imerso em Torá e mitsvot, porém se não esperar Mashiach e a salvação do povo judeu, ficará envergonhado no dia do julgamento…” (Os dias de Mashiach. Editora: Chabad, 1992-2007, páginas 23 e 24, e 37).
Existe outro pensamento judaico no sentido de que a redenção está no Messias, qual tem a missão de restaurar as tribos perdidas, veja:
“No futuro, o rei Messiânico virá e renovará a dinastia davídica […] reunirá os remanescentes dispersos de Israel…” (Hilchot Melachim 11: 1).
E mais: nos textos já citados de Isaías, podemos ver que além de o Messias ter a missão de restaurar as Duas Casas de Israel, também tem a missão de trazer muitos gentios para a luz, trazendo-os para o caminho que leva à vida eterna. De fato, a Escritura conta que a Nova Aliança será feita com as Duas Casas de Israel (Jeremias 31: 31-33), mas não deixa isento o crente gentio de poder fazer parte da aliança também (Deuteronômio 29: 14-15). Por isso o apóstolo Paulo escreveu que o Messias aproximou os crentes gentios para próximo da comunidade de Israel (Efésios 2: 11-13).
Até mesmo os Essênios, que eram um grupo de sacerdotes que foram morar no deserto, acreditavam que Isaías 53 é uma profecia messiânica, confira um breve trecho da obra "Regra de Damasco":
“... Esta é a exata interpretação da norma 'até que surja o Messias… Ele expiará por seus pecados… será castigado…” (Regra de Damasco, Col. XIV, 19).
Sabemos que os sacerdotes essênios existiam muito antes dos apóstolos, e muito antes do surgimento do Cristianismo como religião de Roma. De modo que, não há fundamento algum em dizer que os cristãos é que tentaram manipular o texto de Isaías. E mais, na obra judaica chamada de "Pesikta Rabati", escrita por volta de 845 d.C, fala que o Messias tem a missão de sofrer por causa dos pecados da nação de Israel (Capítulos 36: 4-6; 37: 2-4).
Outros costumam dizer que os textos em português traduzem o texto de Isaías 53 totalmente errado, buscando meios para dizer que o texto está sendo manipulado pelos cristãos. Dizem que uma tradução literal do texto em hebraico faz cair por terra a ideia de que o texto se refere ao Messias. Não obstante, tal teoria também é sem fundamento, já que o Rabino Shim'on Bar Yochai também atesta que o Messias é o servo sofredor de Isaías 53, e ninguém ousaria dizer que este erudito não sabia ler hebraico, já que todos os 23 livros que compõe o Zohar (o livro do esplendor) foram escritos neste idioma. Eis o que diz o Zohar sobre a missão do Messias:
“No jardim do Éden há um salão que é chamado de "Salão do aflito" Agora é neste corredor que o Messias vai e convoca todas as aflições e dores e sofrimentos de Israel virão sobre ele. E se Ele não tivesse aliviado os filhos de Israel de suas tristezas, e tomado o fardo deles sobre Si, não haveria ninguém que pudesse suportar o sofrimento de Israel como punição pelo descumprimento da Torá. Assim está escrito: "Certamente ele carregou nossas doenças e nossas dores." (Is. 53: 5) Enquanto os filhos de Israel viveram na Terra Santa, eles evitaram todas as aflições e sofrimentos do mundo pelo serviço do santuário e pelo sacrifício. Mas agora é o Messias que os está evitando do habitantes do mundo.” (Zohar 2: 212a). (Tradução do Rabino James Scott Trimm)
De fato, numa tradução literal do texto de Isaías, veremos que o Messias era um homem conhecido por causa de uma doença/ enfermidade, doença essa que não era dele mesmo e sim do povo dele (versos 3 e 4). Eis os textos:
נִבְזֶה֙ וַחֲדַ֣ל אִישִׁ֔ים אִ֥ישׁ מַכְאֹב֖וֹת וִיד֣וּעַ חֹ֑לִי וּכְמַסְתֵּ֤ר פָּנִים֙ מִמֶּ֔נּוּ נִבְזֶ֖ה וְלֹ֥א חֲשַׁבְנֻֽהוּ
אָכֵ֤ן חֳלָיֵ֙נוּ֙ ה֣וּא נָשָׂ֔א וּמַכְאֹבֵ֖ינוּ סְבָלָ֑ם וַאֲנַ֣חְנוּ חֲשַׁבְנֻ֔הוּ נָג֛וּעַ מֻכֵּ֥ה אֱלֹהִ֖ים וּמְעֻנֶּֽה
Tradução:
“Ele era desprezado, evitado pelos homens, um homem de sofrimento, familiarizado com a doença. Como alguém que escondeu seu rosto de nós, Ele foi desprezado, não o consideramos.
No entanto, foi nossa doença que ele estava suportando, Nosso sofrimento que ele suportou. Nós o consideramos atormentado, ferido e afligido por D’us.”
Nele não havia falsidade ou injustiça, e por conta disso, ele se voluntariou para sofrer pela doença do povo (versos 9 e 10). Curiosamente, ao lermos o verso 10 em hebraico, iremos encontrar a palavra אָשָׁם֙ (asham), que é um termo técnico que indica "oferta pelo pecado". Eis o texto:
וַיהוָ֞ה חָפֵ֤ץ דַּכְּאוֹ֙ הֶֽחֱלִ֔י אִם־ תָּשִׂ֤ים אָשָׁם֙ נַפְשׁ֔וֹ יִרְאֶ֥ה זֶ֖רַע יַאֲרִ֣יךְ יָמִ֑ים וְחֵ֥פֶץ יְהוָ֖ה בְּיָד֥וֹ יִצְלָֽח
Tradução:
“Mas o Senhor escolheu esmagá-lo pela doença, para que, se ele se fizesse uma oferta pela culpa, pudesse ver a descendência e ter vida longa, e que através dele prosperasse o propósito do Senhor.”
Isso significa que o servo sofredor é um Asham, isto é, uma oferta pela culpa do pecado do povo. Todos que estudam a Torá, sabem que os animais oferecidos como ofertas pelo pecado não podiam ter defeito algum. E todos sabem que o animal sem defeito recebia a culpa de outro ser sobre ele. Primeiro a pessoa levava o animal sem defeito para o sacerdote, e tinha o costume de colocar a mão sobre a cabeça do animal como sendo uma simbologia de transferência de culpa pelo pecado. O pecado do ser humano era transferido para o animal, que morria por causa de um pecado que ele não cometeu. Por isso que Isaías 53 diz que o servo sofredor era conhecido por causa de doenças/ enfermidades, doenças que não eram suas e sim de outras pessoas. Por acaso Israel pode ser considerado um povo sem pecado algum? Poderia ser considerado uma oferta sem defeito?
Resposta objetiva: Óbvio que não (Isaías 1: 3-4), portanto, o servo sofredor não é a nação de Israel, e sim uma pessoa que é representante da nação de Israel, a saber, "O Messias". Sendo o representante de Israel, ele pode derramar o seu sangue, e fazendo isso pode perdoar os pecados de Israel, pois sem derramamento de sangue não há remissão de pecados (Talmud Bavli, m.Zevachim 6a). O derramamento de sangue era o elemento fundamental para a realização da remoção da culpa dos pecados (kapará).
O Targum Yonatan (capítulo 52: 13) confirma que o servo sofredor é o Messias, veja:
הָא יַצְלַח עַבְדִי מְשִׁיחָא יְרוּם וְיִסְגֵי וְיִתְקוֹף לַחֲדָא
Tradução:
“Eis que Meu Servo, o Messias, prosperará; ele será exaltado, grande e muito poderoso.” (Traduzido pelo Rabino James Scott Trimm).
Outros ainda podem continuar questionando, "dizendo que um homem não pode morrer pelo pecado de outros. Dizem que isso é um pensamento totalmente pagão e que não recebe amparo nas lições do Judaísmo." Não obstante, essa ideia é totalmente enganosa, pois a própria literatura judaica atesta que o Messias deveria morrer pelo pecado de muitos.
O Midrash, fala sobre o tempo em que não iria mais existir o Templo Levítico para fazer sacrifícios de expiação. Moisés questiona o ETERNO a respeito desta questão, e Ele (o ETERNO) responde que tomaria o homem mais justo dentre o povo de Israel para fazer a expiação de pecados definitiva, confira:
"... Moisés disse a Elohim: Chegará o tempo em que Israel não terá Tabernáculo nem Templo? O que acontecerá com eles então? A resposta divina foi: Eu tomarei um de seus homens justos, e o manterei como penhor (garantia) em favor deles, para que eu possa perdoar todos os seus pecados…". (Shemot Rabbah 35: 4).
Sabemos que o Templo Levítico foi destruído no ano 70 d.C, e de lá pra cá nunca mais foi realizado o sacrifício de animais para fins de expiação. Curiosamente, o Talmud ensina que à 40 anos antes da destruição do Templo em Jerusalém, o ETERNO já não estava mais aceitando o sacrifício de animais.
O Talmud Bavli registra:
“Nossos rabinos ensinaram que ao longo dos quarenta anos em que Simão, O Justo, serviu [...] o tecido vermelho se tornou branco. Daquela época em diante, ele às vezes ficava branco e às vezes não [...] ao longo dos últimos quarenta anos antes de o Templo ser destruído [...] o tecido escarlate nunca ficou branco” (Talmud Bavli, m. Yoma 39a-39b).
Eis a declaração do Talmud Yerushalayim:
“Quarenta anos antes da destruição do Templo, a luz central (da Menorah) se apagou, a fita vermelha do Templo, permaneceu vermelha, e o sorteio para Adonay sempre aparecia na mão esquerda. Eles fechavam as portas do Templo à noite e pela manhã às encontravam bem abertas". (Jacob Neusner, The Yerushalmi, página 156-157).
Explicação. Os sacerdotes tinham o costume de colocar um tecido vermelho em cima do animal de sacrifício. Se o tecido vermelho ficasse branco milagrosamente, significava que o ETERNO havia aceitado o sacrifício, mas se o tecido não ficasse branco, significaria que o ETERNO não aceitou o sacrifício. E dizem os rabinos no Talmud que o tecido nunca mais havia ficado branco desde aquela época. Portanto, o ETERNO não estava mais aceitando o sacrifício de animais. Por quê?
A resposta é simples: quarenta anos antes da destruição do Segundo Templo ocorreu a morte expiatória de Yeshua, nosso Messias! Esta é a razão pela qual o sacrifício de animais cessou, pois o justo já havia feito a kapará (remoção de pecados) perfeita e definitiva pelo povo!!! Atualmente, as pessoas recebem o perdão de pecados quando reconhecem o sacrifício de Yeshua como sendo uma obra redentora celestial, caso contrário ainda permanecerão com seus pecados.
Na Enciclopédia Judaica (Jewish Encyclopedia), há um estudo do Rabino Kaufmann Kohler, o qual é Presidente do Hebrew Union College, Cincinnati, Ohio. Ele diz que no período do Segundo Templo se desenvolveu a ideia de que a morte de um justo poderia servir como expiação de pecados pelo povo, os quais estavam pautados em vários episódios ocorridos na história do povo antigo povo hebreu. Esse conceito foi incorporado ao Judaísmo de tal maneira, que serviu como fonte para os apóstolos falarem sobre a morte expiatória de Yeshua, tal como escreveu o apóstolo Paulo e o apóstolo João. Ele (o rabino Kaufmann) diz que o princípio da Expiação pelo sangue sacrificial foi, em geral, respeitado durante o segundo Templo.” (https://jewishencyclopedia.com/articles/2092-atonement). De fato, esse conceito da morte de justos para fins de expiação, é encontrado em várias literaturas judaicas, tal como o próprio Talmud Babilônico, confira:
“Disse o Rabino Ammi: por que o relato da morte de Miriam está colocado ao lado das Leis da Novilha Vermelha? Para nos informar que assim como o ritual das cinzas da novilha vermelha faz expiação, o mesmo acontece com a morte do justo que faz expiação de pecados pela vida dos pecadores." (Moed Katan 28a). Confira também, o Tratado de Berakhot 62b).
O Zohar também ensina que um Tzadik (justo) é alguém que pode ser aceito como sacrifício expiatório:
"Uma pessoa que é justa, é por si mesmo um sacrifício dado por expiação, porque sacrifica seu próprio desejo superando sua vontade. Mas uma pessoa que não é justa, não é aceita como sacrifício porque ela está manchada. Como está escrito: "Eles não serão aceitos a vosso favor" (Vayikrá/ Levítico 22:25). Então os justos […] expiam o mundo e são aceitos como sacrifícios neste mundo".
O Zohar (o livro do esplendor) continua afirmando:
"Quando Elohim deseja dar a cura ao mundo. Ele fere um representante tsadik (justo) dentre eles com aflições e sofrimentos, e através deste justo dá a cura para todos, como está escrito: mas ele foi ferido pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades e pelas suas pisaduras fomos sarados (Yeshayahu/Isaías 53: 5). Um tsadik nunca é atingido, a não ser para trazer a cura para a sua geração e para fazer expiação por ela". (Zohar; seção 3, página 218).
Assim sendo, a ideia de que um justo pode ser tomado como expiação de pecados é um conceito absolutamente judaico. Portanto, quando a Escritura ensina que "uma pessoa não pode morrer pelo pecado da outra"(Ezequiel 18: 20), é para ser interpretado como diz o Zohar logo acima. Devemos entender que os seres humanos comuns estão sujeitos a falhas, e não servem como sacrifício de expiação se não forem perfeitos, mas há uma exceção: “um tsadik (justo) pode servir como sacrifício de expiação.” Sabemos que Yeshua era sem defeito algum, o qual não cometeu pecado e na sua boca se achou engano algum. Assim, Yeshua pode ser considerado o Tsadik dos tsadikim (O justo dos justos), O grande Tsadik.
Quando falamos de morte expiatória de um justo, não estamos dizendo que os sacerdotes sacrificavam seres humanos, não é isso. Estamos falando que se um justo viesse a morrer pelas mãos de um outro povo pecador, seu sangue derramado e seus méritos serviriam como expiação de pecados do seu próprio povo.
Essa ideia não é estranha ao Judaísmo, já que o livro de Macabeus declara que os macabeus enfrentaram o exército idólatra de Antíoco Epifânio, e um Tsadik antes de morrer em batalha, pediu ao ETERNO que o seu sangue servisse como expiação pelo pecado do povo. E todo o texto sugere que o ETERNO aceitou o seu sacrifício, confira:
"E quando sua carne tinha sido queimada e ele estava prestes a expirar, Eleazar levantou os olhos a Elohim e disse: Tu sabes Elohim, que, embora eu poderia ter salvo a mim mesmo, eu estou morrendo por causa da Torá. Tenha misericórdia do teu povo Israel e aceite nosso castigo como expiação por eles. Faça do meu sangue sua purificação e leve minha vida em troca da deles.” (IV Macabeus 6: 26-29).
O contexto a seguir sugere que o ETERNO aceitou o sacrifício dos justos:
"E estes homens, portanto, depois de terem dado a vida… Através de suas mortes nossa nação foi purificada, tendo eles se tornado uma expiação pelos pecados de nossa nação; e por meio do sangue destes homens justos e piedosos e da expiação pelas suas mortes, Elohim salvou Israel…” (IV Macabeus 17: 21-22).
Para finalizar o estudo, selecionamos um trecho bíblico para que as pessoas possam fazer a leitura e se arrepender de seus maus caminhos:
“O qual, quando o injuriavam, não injuriava, e quando padecia não ameaçava, mas entregava-se àquele que julga justamente; Levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas fostes sarados. Porque éreis como ovelhas desgarradas; mas agora tendes voltado ao Pastor e Bispo das vossas almas." (1ª Pedro 2:23-25).
Que as pessoas possam enxergar que os apóstolos não estavam inventando conceitos estranhos ao Judaísmo de seu Tempo. Eles falaram sobre coisas que já eram aceitas pela maioria do povo judeu, uma vez que a ideia de a morte expiatória de justos poder servir como kapará pelo povo, já estava introduzida como doutrina fundamental no Judaísmo.
Seja iluminado!!!
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