Por: Cleiton Gomes
Todos sabemos que Abraão morava no meio de uma população totalmente idólatra, até mesmo seus progenitores eram idólatras (seus pais). Apesar disso, desde jovem ele tinha um pensamento diferente a respeito da divindade suprema, e, diferente da maioria das pessoas, ele buscava uma conexão com o verdadeiro e único Criador dos céus e da terra. Ensina a tradição judaica que Abraão confrontou seu próprio pai a respeito da divindade suprema, veja o que diz o Sêfer Avram (O Livro de Abrão):
“Isto eu [Abrão] digo: O fogo é mais venerável em formação, pois mesmo aquilo que não se subjuga é por ele subjugado, e ele zomba daquilo que perece facilmente por seu intermédio queimando. Mas ele também não é venerável, pois ele é sujeito às águas. Porém as águas são mais veneráveis do que ele, porque elas dominam o fogo e adoçam a terra com frutos. Mas eu também não a chamarei de deusa, pois as águas subsistem debaixo da terra e são a ela sujeitas. Mas eu também não chamarei [a terra] de deusa, pois ela é secada pelo sol e subordinada ao homem para a sua obra.
Mais venerável entre os deuses, digo, é o sol, pois com seus raios ele ilumina todo o universo e os diversos ares. Mas eu não o colocarei entre os deuses, pois há quem obscurece o seu curso através da lua e das nuvens. Também não chamarei de deuses a lua e as estrelas, pois elas também, em alguns momentos durante a noite, diminuem sua luz.
Ouça Terach, meu pai, eu buscarei perante ti o Elohim que criou todos os deuses que nós supomos existir. Pois quem é, ou qual é, o que fez os céus carmesim e o sol dourado, que deu luz à lua e às estrelas com ela, e que secou a terra em meio às águas, e que colocou até você mesmo entre as coisas e que me fez sair da perplexidade de meus pensamentos? Elohim revelará a Si mesmo por Si mesmo para nós!”
E sucedeu que enquanto eu pensava tais coisas acerca do meu pai Terach na sala de minha casa, a voz do Poderoso desceu dos céus em uma corrente de fogo dizendo e chamando: “Abrão, Abrão!” E eu disse: “Eis-me aqui!” E ele disse “Você está buscando o Elohim dos deuses, o Criador, pelo entendimento do seu coração. Eu O sou. Sai de perto de Terach, seu pai, e sai de casa, para que você também não morra nos pecados da casa de teu pai.”
E sucedeu que quando eu saía – eu não estava ainda fora da entrada da sala - o som de um grande trovão veio e o queimou com sua casa, e tudo em sua casa, até o chão, quarenta cúbitos. Então uma voz veio a mim falando duas vezes: “Abrão! Abrão!”, e eu disse: “Eis me aqui!” E Ele disse: “Eis que sou Eu. Não temas, pois Eu sou contigo. Eu sou anterior às épocas, sim, o Poderoso Elohim que criou a primeira luz do mundo. Eu sou o teu escudo e o teu ajudador”.
Por causa de seu pensamento monoteísta, recebeu o chamado do ETERNO para sair do meio da sua parentela e ir para uma região distante (Gênesis 12). O que nos chama a atenção é que Abraão conseguiu ganhar muita gente, fazendo com que eles pudessem crer no verdadeiro Elohim. Por isso a Escritura diz que, “as almas que ele conquistou em Harã", foram com ele até a região ordenada pelo ETERNO (Gênesis 12: 5). Outro detalhe bem interessante é o que nos conta a tradição judaica, pois, podemos encontrar um ensino no sentido de que Abraão sempre construía sua enorme tenda no meio de encruzilhadas, de maneira que todos os viajantes que passavam por ali, teriam que passar por dentro da tenda dele (a tenda dele era aberta para todos os lados). Por que ele erguia sua tenda no meio da rota dos viajantes?
Simples, este era o método utilizado por Abraão para pregar a respeito da existência do verdadeiro Elohim, e isso era feito da seguinte maneira. Quando os viajantes estavam famintos, paravam para comer na tenda de Abraão. Após os viajantes se sentarem à espera da comida, Abraão lhes trazia a melhor comida que tinha em sua posse, mas antes que os viajantes tivessem a oportunidade de colocar a comida na boca, o patriarca (Abraão) lhes pedia para fazer uma reza ao verdadeiro Criador dos céus e da terra. Lógico que os viajantes não iriam saber fazer a reza e, certamente, questionariam Abraão por conta disso. E Abraão queria que isso acontecesse mesmo, pois ele teria a oportunidade de ensinar a reza para os viajantes. A reza consistia em agradecer ao verdadeiro Elohim, criador dos céus e da terra, por lhes ter dado comida e bebida. Era simples assim.
Geralmente a comida era gratuita, o pagamento consistia em fazer apenas aquela reza em agradecimento ao ETERNO. Abraão dava comida gratuita porque ele era uma pessoa muito rica, dono de muito gado, entre outros patrimônios, seu coração também era rico em benevolência. Embora a comida fosse gratuita (os viajantes nem sempre sabiam disso), quando as pessoas não queriam aprender a fazer a reza e muito menos pronunciá-la, Abraão cobrava um preço bastante alto naquela comida. Certamente o viajante ficaria indignado com aquilo, no entanto, ele teria apenas três alternativas: (1) ir embora, mesmo estando com muita fome e tentar a sorte de encontrar algum alimento no caminho, (2) pagar um preço caríssimo pela comida, ou (3) aprender a oração proposta por Abraão e comer uma comida muito gostosa totalmente de graça.
Acredito que somente um tolo escolheria as duas primeiras opções. Os mais inteligentes sempre iriam escolher a terceira alternativa, que era aprender a oração de agradecimento ao verdadeiro Elohim, e comer a comida de graça. Assim, o viajante aprendia algo novo, e após comer, continuava a fazer sua viagem de barriga cheia.
Penso que Abraão utilizava este método para não ter que arranjar inimigos ao tê-los que confrontar a respeito da crença politeísta deles. Pois, sabemos que tocar num assunto que envolva a fé das pessoas, é uma coisa bastante delicada, e caso a pessoa não saiba a maneira correta de pregar para os mesmos, em vez de ganhar amigos, ganha inimigos.
Um pequeno vislumbre de que Abraão era bastante receptivo para com os viajantes, se encontra escrito em Gênesis 18. Sabemos que ele recebeu todos os viajantes que estavam passando por ali, e lhes deu comida. Agora, o interessante de tudo é que, O Midrash Tanchuma (Vayera, Siman 3) e o Targum Yonatan (sobre Gênesis 18:1), nos ensinam que Abraão estava no terceiro dia de sua circuncisão, e durante o terceiro dia a dor e a febre se tornam pulsantes (Veja, por exemplo, Gênesis 34:25). Mesmo estando neste estágio de intensa dor e febre, Abraão foi receptivo para com os viajantes, lhes dando comida e bebida. Isso mostra que uma grande bondade pulsava em seu coração a ponto de não se importar com sua própria dor.
Abre um parêntese: O Midrash Tanchuma (Vayera, Siman 3) ensina que quando Abraão recebeu o pedido do ETERNO para fazer a circuncisão sobre si, antes ele consultou seus três melhores amigos (Aner, Escol e Mamre). Aner e Escol se puseram contra a circuncisão de Abraão, dizendo que ele poderia morrer se fizesse aquilo devido a sua velhice e também porque seria uma presa fácil diante do ataque de inimigos. Somente Mamre deu uma resposta sábia para Abraão, dizendo:
“Você precisa procurar meu conselho sobre esse assunto? Ele [O ETERNO] não o libertou da fornalha ardente, não fez milagres em seu favor e o salvou dos reis? O fato é que você teria sido destruído há muito tempo se não fosse por Sua força e poder. Ele [o ETERNO] salvou seus duzentos e quarenta e oito membros, e ainda assim você pede conselhos sobre apenas um pedaço de um de seus órgãos. Faça como Ele ordenou!" Em seguida, o Santo, bendito seja Ele, exclamou: Bendito seja você por tê-lo aconselhado a ser circuncidado.”
A ideia de que Abraão foi salvo de uma fornalha ardente, é contada no Pirkei Avot 5:3, e em muitas outras literaturas judaicas. No Midrash (Bereshit Rabá 38:13), por exemplo, podemos aprender que Abraão, constantemente, desafiava os delírios da idolatria de Nimrod, que farto das provocações dele, ordenou que se preparasse uma fornalha para jogar Abraão ali dentro. Após ser jogado no fogo, todos esperavam que ele fosse morto, mas para a surpresa deles, Abraão saiu de lá ileso.
O Talmud (Pesachim 118a), nos conta que Gabriel pediu ao ETERNO para ir salvar Abraão da fornalha, e em resposta a ele, o ETERNO disse que ele mesmo iria lá para salvá-lo, veja as palavras deste documento:
“Quando o maligno Nimrod jogou nosso pai, Abraão, na fornalha ardente, Gabriel disse diante do Santo, Bendito seja Ele: Mestre do Universo, descerei e esfriarei a fornalha, e assim salvarei o justo Abraão da fornalha ardente. O Santo, Bendito seja Ele, disse-lhe: Eu sou único no meu mundo e Abraão ainda é único no seu mundo. É apropriado para o único salvar o único. Portanto, o próprio Elohim desceu e o salvou”.
Fecha o parêntese.
Através de tudo isso, podemos aprender que Abraão não media esforços para pregar as boas novas. Sua forma de pregar era bastante flexível, e pelo fato de ele ser uma pessoa bastante caridosa, as palavras que ele pregava eram aceitas de bom grado. Podemos aprender, com ele, que mesmo passando por um momento muito difícil, podemos suportar a nossa dor e nos dispor a ajudar o próximo. Através dessa ação voluntária dele podemos ver que, em sua vida, “o mandamento de amar o próximo como a si mesmo”, era algo que estava gravado no seu coração.
Seja iluminado!!!
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